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terça-feira, 2 de novembro de 2010

Hitória do AcidJazz

Na década de 1980 os dj’s ingleses Chris Bangs e Gilles Peterson inventaram a expressão acid jazz. Eles estavam numa daquelas festas que duravam dias, chamadas raves (eventos que, curiosamente, hoje são considerados grandes novidades pelos jovens adolescentes). Na verdade, as raves já eram realizadas em Roma há 2.000 anos atrás e, mesmo no Rio de Janeiro de 1910, eram famosas as raves promovidas pelas denominadas “tias”. Entre elas está Tia Ciata, uma das mais famosas tias do Estácio. Ela pode ser considerada uma das criadoras daquilo que não seria impróprio denominarmos de acid samba, regado a muita cachaça e cavaquinho. Em todos os casos, tanto em Roma quanto no Rio de 1910 ou na Londres de 1980, as raves aconteciam em espaços amplos, com diversos ambientes, cada um deles apresentando um tipo de música diferente. No caso inglês, um dos tipos de som era a chamada house music, nascida em Detroit e Chicago numa época em que o ecstasy e o LSD rolavam solto. Todo iniciado sabe que o apelido do LSD era ácido, daí os termos acid house music (termo geral aplicado para designar os sons que rolavam numa rave) e acid jazz (termo aplicado especificamente ao jazz praticado nessas raves). Assim, de uma brincadeira criada por dois divertidos dj’s – misturando dance music com velhos lp’s de jazz, nascia um estilo com várias características próprias. Bangs, Peterson e vários outros disc jockeys tinham predileção pelo hard bop mais funky, principalmente aquele gravado na década soul de 1960 para a Blue Note e para a Prestige. Com o sucesso da coisa, Peterson chegou a fundar o selo Acid Jazz, lançando vários músicos que definiriam o estilo, baseado fundamentalmente numa música para dançar ou, quando a intenção era arejar a cabeça e relaxar, o acid jaz recebia o nome de easy listening ou smooth jazz. Enquanto isso, nos EUA, os rappers passam a utilizar passagens de jazz em suas execuções, quase sempre apropriando breves trechos que serviriam simplesmente como introdução ou, de forma mais elaborada, como motivos (riffs) que dariam sustentação contínua às suas performances. Dos velhos lp’s, retiravam não apenas os ritmos e melodias que formariam o pano de fundo de suas obras, como também extraíam dali uma certa dose de valorização artística pelo simples fato de citarem passagens elementares de jazz, sabidamente a forma mais elaborada de música popular afro-americana. Curioso, no caso do rap, é que há uma inversão da importância do solista de sopro (melodia) em relação à bateria (ritmo), sendo esta última colocada, como se sabe, num patamar extremamente privilegiado pelos rappers. Os curtos solos de sax e trompete passam a fornecer o pano de fundo (background) para o percussionista/vocalista (foreground), coisa até então inimaginável no mundo do jazz. Essa inversão de papéis é muito mais profunda e radical do que a conhecida valorização do ritmo (vide Art Blakey & friends) ocorrida durante o hard bop dos anos 1950. Nesse processo de manipulação de passagens jazzísticas em suas produções musicais, tanto os dj’s quanto os rappers utilizam uma série de procedimentos específicos para produzirem sua música: 1) sampling, que consiste na apropriação eletrônica de pequenos trechos (samples) de velhas gravações analógicas – nesse contexto surgem as mixagens (misturas e manipulações de solos de velhas gravações em lp, normalmente feitas ao vivo em dance clubs) e o programming (misturas e manipulações de solos de velhos lp’s usualmente realizadas em estúdios e lançadas em cd’s como obra nova, protegidas inclusive por direito autoral); 2) looping, que seria a repetição sistemática dos samples – trechos apropriados de antigos lp’s. A repetição contínua desses samples, que recebe o nome de looping, é enriquecida mediante uma alteração da batida (beat) através da utilização de baterias eletrônicas ou sintetizadores. É aqui que o conceito tradicional de músico merece ser revisto: se você considera que acid jazz é música, deve aceitar o fato de que ela não foi feita por músicos no sentido tradicional do termo. O acid jazz foi criado por disc jockeys e rappers que, ao invés de manipularem notas musicais, manipulam partes de músicas prontas, quase sempre lhes alterando o ritmo.