Em 1944, a Expedição Roncador-Xingu contatou o povo Xavante, ainda hostil. Dois anos depois, estabeleceu contatos pacíficos com cerca de 14 povos do alto Xingu, de grande diversidade cultural, lingüisticamente representantes das Famílias Tupi, Aruak, Karib e Jê. Estes povos, que continuavam vivendo da mesma forma que Steinen os encontrara no século XIX, tinham sofrido um decréscimo populacional sensível, devido aos ataques violentos de gripe, disenteria e outras doenças infecciosas, que começaram a invadir a região cerca de 30 anos antes. Teriam sido contagiados, aparentemente, porque alguns grupos de índios, deslocando-se pelos rios, haviam encontrado colonos brasileiros ao longo do Rio Paranatinga e em outros lugares.
Mantendo contato com Rondon e com outros indigenistas, os irmãos Villas Boas decidiram permanecer no Xingu e desenvolver aí um programa positivo de proteção aos índios, buscando assegurar-lhes uma base territorial onde pudessem manter seus modos tradicionais de organização social e de subsistência econômica, além de fornecer-lhes assistência médica contra doenças exógenas. Os irmãos defendiam a criação de reservas e parques indígenas fechados, que funcionassem como uma espécie de tampão protetor e seguro entre índios e sociedade brasileira. Eles achavam que o processo de integração dos povos indígenas na sociedade nacional deveria ser gradual, de forma a garantir a sobrevivência física, as identidades étnicas e os estilos de vida de cada um daqueles povos.
Em 1952, a questão foi levada a debate junto à Presidência da República e foi elaborado um documento legal solicitando a criação do Parque Nacional Indígena do Xingu, ocupando grande extensão de terras da parte setentrional do estado de Mato Grosso. Este seria o primeiro parque indígena do Brasil. Era visto como uma experiência incomparável de proteção aos povos indígenas e a seus habitats naturais contra os perigos representados por uma sociedade que estava vivendo um período de rápida e drástica transformação econômica e social. Os irmãos Villas Boas foram nomeados para serem seus primeiros diretores, e o Parque foi colocado sob a responsabilidade conjunta do SPI, do Museu Nacional (RJ), do Instituto Oswaldo Cruz, do Conselho Nacional de Pesquisas (CNPq) e do Instituto Histórico e Geográfico do Mato Grosso.
Depois de sofrer sérias ameaças, entre elas uma tentativa do governo do Estado de Mato Grosso de fornecer concessões de terras do Parque a companhias e especuladores imobiliários, bem como uma epidemia de sarampo que quase dizimou toda a população da área, o Parque foi criado oficialmente em 19 de abril de 1961, quando o Congresso Nacional aprovou o Decreto nº 50.455, estabelecendo suas fronteiras legais. Em todo esse processo, a atuação dos irmãos Villas Boas junto à opinião pública e aos órgãos governamentais foi decisiva. Dessa forma, lograram conseguir que o governo brasileiro tomasse as medidas necessárias à retomada dos territórios irregularmente concedidos pelo governo do estado e ao combate à epidemia de sarampo e outras doenças que ameaçaram a população do Parque.
Durante vários anos os irmãos Villas Boas estiveram à frente do Parque Nacional do Xingu. Sua atuação teve muitos aspectos positivos e outros nem tanto. Organizaram um programa sistemático de saúde pública, vacinações e assistência médica para os índios, colocando sob controle quase todas as doenças epidêmicas e favorecendo o crescimento populacional. Entretanto, ao fornecerem aos índios do Xingu uma ampla gama de ferramentas e de bens materiais, provocaram algumas mudanças nas relações, no interior das sociedades indígenas, entre elas havendo, por exemplo, um decréscimo na produção artesanal nativa e um movimento paralelo de substituição do comércio entre os vários povos por uma maior dependência econômica destes em relação ao Posto Indígena, sede do Parque. Outra mudança importante foi a diminuição do poder dos chefes e um aumento correspondente do poder dos funcionários que trabalhavam no Posto Indígena. Ainda assim, as inovações introduzidas gradualmente pelos irmãos Villas Boas não chegaram a ter efeitos destrutivos no que diz respeito à coesão social de cada um daqueles povos. Por outro lado, as medidas sanitárias preventivas que adotaram e o controle que mantiveram das relações entre índios e estranhos ao Parque foram fundamentais para garantir sua sobrevivência.
Fonte: http://www.funai.gov.br/indios/personagens/vilas_boas.htm